quinta-feira, 16 de julho de 2009

Palavra


Quando Palavra fica presa, é inafiançável. Quer sair, mas não sabe se pula de vez da prancha para cair na maledicência ou se continua amarrada no mastro, a divagar na dúvida infinita.

Há quem tentasse libertá-la. Mãos estendidas, conversas francas. Palavra recusa. Arrogância sua, da época que andava com Tempo. Tempo e Palavra já foram muito amigos, acredite. Mas Palavra cismava de querer fazer tudo por si mesma. Tempo, diplomático, sempre paciente.

Mas cansou. Como cansara de tantos, antes. Deu um adeus à sua maneira, parágrafo solitário. Tempo se fez de compreensivo, mas seguiu seu caminho, desgostoso. Jogou alguns eufemismos para abandono e foi-se, folha seca no vento. Apenas mais uma das invencionices de Palavra. Adorava pôr coisas onde antes só existia um extenso espaço em branco. Um grande defeito seu; estar na hora errada, no lugar errado. Quem poderia amar mais o desenho desenfreado das letras em linhas tortas?

Pôs os pés na estrada e as pernas pro ar. Pulou de gente em gente, a fim de experimentar várias bocas, timbres, entonações. E agora, parou naquele lugar, impotente, inconseqüente. Encontrou uma língua travada e cordas vocais hesitantes. Tentou fugas desesperadas, mas elas sempre acabavam em suspiros.

O Silêncio, mais do que nunca, a sufocava. Palavra odiava Silêncio. Ele tem caminhado freqüentemente de mãos dadas com Tempo. E ela mal podia conter a sua inveja.

Tempo fez que não viu. Seguiu a sua longa jornada, sem olhar para trás. Palavra teve sua chance. Tentou ajudar. Ela recusou. E, se recusou, é porque não precisava.

Grita, sem som. Agora que tanto precisa, a voz não sai. Os dentes cerrados empurram seus esforços de volta para si, arrego involuntário. Desanima. Porque sabe que quem muito fala, uma hora se cala.

10 comentários:

Henrique Miné disse...

hmm..
que maluquice, não?

Jaya Magalhães disse...

No meu silêncio, cabem todas as palavras. Até as que não cabem.

E no tempo, eu sou.

Teu texto me confundiu pra caramba, mas depois que eu desisti de tentar entender, ele fluiu em mim. Eu acabei sentindo. E quem sente, não explica.

Beijo, Sam.

Luana Mendes disse...

E as palavras que ficam presas na garganta, estas podiam mudar tudo.

Saudade, Sam.

Gαby Oliveirα!* =)) disse...

Sam, que saudade...
Adorei o texto, não sei dizer exatamente o porquê, mas ele me fez refletir. =/

Beeeijos.

gcavalcanti disse...

- As detestáveis palavras não ditas. Belo texto.

Daninha disse...

Esse seu texto me lembrou aquela musica:

"Palavras apenas, palavras pequenas, palavras ao vento."

;*

gabriela r :* disse...

Lindo!! amei seu blog, to te seguindo, passa no meu tbm: (http://mylive-gabi.blogspot.com/)
Beijinhoss ;*

Anônimo disse...

eu conheço essa foto ha muitos anos e p mim ela é auto explicativa e vc fez jus e ela.

amei

beijos

Francisca Nery disse...

e quando você tem aqueles sonhos que precisa gritar socorro e fica muda? ou tem que correr e as pernas não se mexem? :x

Anônimo disse...

A palavra guardada, engasgada, suprimida, quando vai pra fora, só faz mau, tanto pra quem disse, tanto pra quem ouviu.